Direito Penal

Lavagem de dinheiro: o que é, como funciona e quais são as consequências legais

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A expressão “lavagem de dinheiro” já se tornou familiar no noticiário, especialmente em contextos envolvendo crimes financeiros, corrupção e operações investigativas de grande porte. Mas o que, de fato, caracteriza esse crime? Como ele é praticado, o que diz a legislação brasileira e quais são os impactos legais para quem é investigado ou acusado desse delito?

Neste artigo, explicamos de forma objetiva os principais aspectos sobre a lavagem de dinheiro: suas etapas, os crimes que costumam precedê-la, as penalidades previstas e os cuidados com a responsabilização de terceiros.

O que é lavagem de dinheiro?

A lavagem de dinheiro consiste na ocultação ou dissimulação da origem, localização, propriedade, movimentação ou disposição de valores, bens ou direitos que sejam provenientes de alguma infração penal. Trata-se, em resumo, de um conjunto de operações que buscam conferir aparência de legalidade a recursos obtidos por meio de atividades criminosas.

A conduta está tipificada na Lei nº 9.613/1998, que foi significativamente modificada pela Lei nº 12.683/2012. Antes de 2012, o crime de lavagem de dinheiros só poderia ser praticado se os valores fossem oriundos de um rol específico de crimes, como tráfico de drogas e armas, terrorismo, extorsão mediante sequestro, ou aqueles praticados contra a administração pública. Após a reforma, entretanto, o crime passou a ser configurado independentemente da natureza do delito antecedente.

Como o crime é praticado?

Cada caso sempre tenha suas particularidades. Mesmo assim, as condutas atualmente criminalizadas podem ser divididas em três diferentes momentos, que não necessariamente são sequenciais, ou dependentes entre si:

  1. Colocação

É o momento em que o dinheiro de origem ilícita é introduzido no sistema econômico ou financeiro, por exemplo, por meio de depósitos bancários fracionados, compra de bens de alto valor ou movimentações em espécie.

  1. Ocultação

Quando a lavagem incide sobre essa etapa, geralmente ela se dá a partir da dispersão de valores, conversão em ativos lícitos, com vistas a dificultar seu rastreamento. É comum o uso de contas em nome de terceiros, empresas de fachada, offshores, ou mesmo conversão para criptoativos ou inserção dos bens em negociações (como ceder o bem em garantia, negociá-lo de alguma forma etc.).

  1. Integração

Etapa em que os valores provenientes de infração penal passam a integrar o sistema financeiro com aparência de licitude. Geralmente, essa integração é feita com base na etapa anterior, da ocultação: mediante investimentos, aquisição de ativos ou abertura de empreendimentos.

Ressaltamos que essas fases não são obrigatórias nem necessariamente sequenciais, mas representam um padrão típico identificado na prática forense. Frequentemente, a dissimulação ou ocultação da natureza dos bens se dá de maneira combinada: primeiro, a origem dos valores é mascarada, depois, esse valor é pulverizado, para então ser convertido em investimentos ou negócios, com vistas a ser conferida uma aparência lícita ao montante.

Quais crimes costumam anteceder a lavagem?

A lavagem de dinheiro depende da existência de um crime anterior que tenha gerado recursos ilícitos. Ainda que não exista qualquer limitação em relação à natureza do crime antecedente, entre os mais recorrentes estão:

  • Corrupção (ativa ou passiva)
  • Tráfico de drogas
  • Fraudes fiscais, corporativas ou contábeis
  • Crimes contra o sistema financeiro
  • Peculato
  • Estelionato e furto
  • Crimes diversos praticados por organização criminosa, assim definida nos termos da Lei nº 12.850/2013

É importante destacar que, conforme entendimento consolidado do Superior Tribunal de Justiça (STJ), não é necessária condenação prévia pelo crime antecedente para a caracterização da lavagem de dinheiro. Em diversos casos, a investigação da origem dos recursos ocorre paralelamente, e de forma independente à apuração da lavagem.

Além disso, há entendimento consolidado da mesma corte no sentido de que para responsabilização pelo crime de lavagem, não é necessário que seu autor também tenha efetivamente praticado o crime antecedente, mas apenas que tenha ciência da origem ilícita dos bens, direitos e valores, e que tenha concorrido para sua ocultação ou dissimulação.

Nesse sentido, as teses nº 1 e 6, do periódico Jurisprudência em Teses, edição 166, publicado pelo STJ em março de 2021.

Quais as penalidades previstas?

De acordo com a legislação brasileira, a pena para o crime de lavagem de dinheiro é de 3 a 10 anos de reclusão, além de multa. Esse patamar pode ser agravado se o crime for cometido de forma habitual, com o uso de organização criminosa ou envolvendo instituições financeiras.

Na hipótese de o autor colaborar espontaneamente com as autoridades, prestando esclarecimentos que conduzam à apuração do crime, à identificação dos demais autores, ou à localização dos bens, a pena poderá ser reduzida de um a dois terços.

Além da pena principal, e da mesma forma como ocorre em outras investigações, medidas cautelares podem ser determinadas para garantir investigar o crime de lavagem, garantir a aplicação da lei penal, ou mesmo eventual reparação do dano. São exemplos dessas cautelares:

  • Busca e Apreensão;
  • Interceptação telefônica/telemática;
  • Quebra de sigilo bancário, fiscal ou telemático;
  • Prisão temporária ou preventiva.

A responsabilidade de terceiros

Um aspecto sensível é a possibilidade de responsabilização de pessoas que não participaram diretamente do crime antecedente, mas constam formalmente em transações ou estruturas envolvidas.

É sempre essencial que os limites da responsabilidade penal sejam respeitados, de maneira que uma pessoa seja processada e julgada apenas por aquilo que efetivamente praticou. Nesse sentido, pessoas que não participaram diretamente do crime antecedente só podem ser responsabilizadas se i) tinham ao menos ciência da infração penal antecedente e se ii) contribuíram de alguma forma com a ocultação ou dissimulação da natureza, origem, localização, disposição, movimentação ou propriedade dos bens, direitos ou valores que são provenientes dessa infração.

Em outros termos: ainda que determinado indivíduo não tenha praticado efetivamente o crime anterior, pode ele ser responsabilizado pela lavagem se tiver conhecimento da origem ilícita dos valores, e se tiver efetivamente atuado para conferir a ele aparência lícita e legítima.

Por que entender esse tema é relevante?

A lavagem de dinheiro é um crime que compromete a integridade do sistema financeiro, afeta a competitividade dos mercados e, em razão de suas particularidades, frequentemente tem suas investigações voltadas a pessoas que não participaram do crime antecedente. Em um cenário de alargamento de acusações relacionadas a esse delito, e com investigações cada vez mais complexas, com uso de tecnologias de rastreamento financeiro e cooperação internacional entre autoridades, conhecer o funcionamento desse crime e seus desdobramentos legais é essencial.

Mais do que conhecer o que diz a lei, é fundamental compreender como ela é aplicada na prática e quais são os direitos, garantias e a extensão de responsabilidade de quem é acusado ou investigado pela prática desse crime.

O Feller Advogados atua na condução de casos de direito penal empresarial, assegurando uma atuação técnica, estratégica e comprometida com o devido processo legal.

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